sabias que o Descartes pode ajudar-te a redigir um e-mail?

note-se: eu gosto de pensar com o pensamento dos outros, todavia sou a favor de que a pessoa se esforce um bocadinho antes e procure tempo e espaço na sua agenda para responder ao meu e-mail. além disso, se está claro para ti, dentro da tua cabeça, tenho a certeza que conseguirás escrever um e-mail claro e distinto. 

entre outras coisas, ler Descartes pode ajudar-te a redigir e-mails com clareza e distinção. tens dúvidas? óptimo, o Descartes também era fã e praticante da dúvida metódica, pelo que não há que recear a dúvida. vamos a isto? 

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René Descartes,  filósofo e matemático, nasceu em 1596 e morreu em 1650. é o autor da célebre frase: “penso, logo existo” que muitos repetem sem nunca ter lido um dos livros do Descartes.

entre outras coisas, conhecer a proposta de Descartes pode ajudar-te a redigir e-mails com clareza e distinção. tens dúvidas? óptimo, o Descartes também era fã e praticante da dúvida metódica, pelo que não há que recear a dúvida. vamos a isto?

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Descartes e a busca da evidência

Descartes recebeu o galardão de “pai da filosofia moderna”, sendo considerado por muitos como um filósofo racionalista. na verdade, Descartes assume um optimismo na razão humana, mas não despreza o papel importante da experiência, na sua busca de compreensão pelo modo como organizamos o pensamento.

o filósofo francês pretendia cultivar a razão e o conhecimento da verdade. para tal empreendeu um método que parte da dúvida para construir um pensamento baseado na clareza e na distinção.

 

Descartes e o passo a passo

o ponto de partida para Descartes é a evidência. trata-se de algo que conhecemos com clareza e distinção, partindo de uma intuição (um acto intuitivo da mente onde não há mediação discursiva).

deste momento, partimos para o momento Jack o Estripador, no qual somos convidados a dividir o pensamento em partes simples, para podermos praticar a análise dos mesmos. vamos por partes e não ousamos pensar tudo de uma vez, nem dar saltos gigantes ( à Nelson Évora) no pensamento.

segue-se a síntese, que nos vai permitir organizar o pensamento, ordenando-o do mais simples para o complexo. note-se que este movimento é simples, mas não é fácil.

chegamos à fase do controlo, em que enumeramos e revemos, verificamos se fomos mesmo praticantes do acto de simplificar. aqui chegados, podemos iniciar tudo de novo: evidência, análise, síntese…

o professor Vítor explica muito bem estes passos do método do Descartes nesta aula do INÉF, que faz parte de um curso de história da filosofia disponível gratuitamente no youtube.

 

afinal, qual é a relação de Descartes com a redacção de um e-mail?

imagina o seguinte cenário: redigiste um e-mail para a pessoa X, com algumas questões sobre o projecto Y. a resposta a esse e-mail é: “posso ligar-te? é mais fácil de explicar se falarmos!”

 

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oh não. isso é que não. tenho para mim – e o Vitor do Isto Não É Filosofia concorda comigo – que quando isto acontece é sinal de que a pessoa ainda não pensou no que quer dizer sobre o assunto. significa que a pessoa não investiu tempo para se sentar em frente ao computador, ler o e-mail da outra pessoa, pensar na resposta, estruturá-la, ler de novo e enviar.

quando a pessoa te ligar, vai partilhar contigo o seu pensamento caótico e tu vais ter de fazer perguntas para poder compreender o seu pensamento.

o hábito de usar audios em plataformas como o whatsapp, quanto a mim, são condutores desta preguiça de pensar antes de falar, de organizar o pensamento antes de o partilhar com o outro.

quem me conhece de parte sabe bem que sou completamente alérgica a chamadas telefónicas; primeiro porque perturbam a organização do meu trabalho e depois porque são momentos em que tenho de lidar com algum caos de pensamento de quem liga.

note-se: eu gosto de pensar com o pensamento dos outros, todavia sou a favor de que a pessoa se esforce um bocadinho antes e procure tempo e espaço na sua agenda para responder ao meu e-mail. além disso, se está claro para ti, dentro da tua cabeça, tenho a certeza que conseguirás escrever um e-mail claro e distinto.

 

em suma, como é que o Descartes me pode ajudar?

eis um passo a passo:

  • com calma, senta-te em frente ao computador.
  • foca-te no e-mail que vais escrever, ignorando as outras notificações que possam surgir.
  • lê o e-mail que te é dirigido.
  • anota (num post it em papel ou dos outros) os pontos chave desse e-mail.
  • salienta o que já é claro e distinto por si para destacar no texto.
  • há alguma coisa que não compreendas? se sim, formula essa necessidade de esclarecimento em forma de pergunta.
  • identifica pontos / temas no e-mail e responde destacando esses pontos /temas no corpo do texto. podes mesmo numerar esses pontos, isso pode ajudar-te na comunicação que se seguirá ao envio do teu e-mail;
  • escreve o e-mail, evitando a pressa no “ENVIAR”.
  • se for preciso, deixa o texto em rascunho, para voltar a ler antes de enviar.

 

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claro que estes procedimentos não se justificam com todos os e-mails que recebes. a clareza e a distinção, na escrita, exigem prática e por isso recomendo que escolas os e-mails importantes para aplicar a proposta de Descartes: evidência, análise, síntese, controlo.

podes começar com coisas simples: desacelerando o teu tempo de resposta aos e-mails, controlando os canais de comunicação, dando privilégio ao texto escrito e evitando os audios. num outro artigo já publicado aqui no blog, abordo os 7 passos para uma comunicação clara e assertiva e que ajuda a pensar nesta questão dos canais de comunicação.

 

Descartes e Edward de Bono, cada um na sua época e na sua forma, defendem a simplicidade, tendo noção de que exige esforço. eu acrescento: é uma questão de treino.

 

*

 

se quiseres ler algum texto de Descartes, recomendo as Regras para a direcção do espírito e o Discurso do Método. é importante procurar alguma contextualização do autor, da sua linguagem e das suas ideias, para facilitar a tua leitura. as aulas do canal Isto Não É Filosofia são uma ajuda preciosa.

 

 

(imagem de destaque: Stephen Phillips, unsplash)